quinta-feira, 18 de junho de 2009



Resistência Indígena

MOMENTOS DA RESISTÊNCIA DOS NATIVOS FRENTE A "VERDADEIRA" FÉ CIRSTÃ NO BRASIL COLONIAL

O principal interesse da coroa portuguesa, no sentido de "descobrir" novas terras, era o de estabelecer novas rotas comerciais. O Brasil, Terra de Santa Cruz, Terra de Vera Cruz, carregava estes nomes não por acaso. Os portugueses, desde à tomada de Celta em 1415, carregavam consigo o espírito das cruzadas. As embarcações da expedição cabralina trazia a cruz da Ordem de Cristo estampada em suas velas. D. Manuel I, então rei de Portugal, era também Grão -- Mestre da Ordem de Cristo.

Em 1500, sob o comando de Pedro Álvares Cabral, o Brasil foi batizado com a fixação em terra da primeira cruz, seguida da reza da primeira missa, proferida, na ocasião, pelo frei Henrique de Coimbra, um franciscano.

Portanto, a religiosidade sempre esteve presente no processo de colonização dos portugueses.
Bahia, na primeira metade do século XVI

Os navegadores portugueses, além da beleza, encontraram também os homens gentios, assim denominados por Manuel da Nóbrega, que representava um dos quadros da Companhia de Jesus, fundada e 1534 por Inácio de Loyola. Era da incumbência de Nóbrega a Missão no Brasil, além da educação dos filhos de colonos. Todas atividades que a Companhia de Jesus realizava era peara glória de Deus, um lema dos soldados de Cristo.

A primeira impressão deixada pelos nativos na visão dos viajantes era de que estes homens gentios não possuíam qualquer vínculo religioso, ou seja, não adoravam nenhum tipo de Deus, nenhuma santidade, ou até mesmo um ídolo. Voltaremos a tratar deste aspecto mais afrente. No entanto, não demoraria muito tempo para que este conceito elaborado pelos portugueses caíssem por terra.

Ronaldo Vainfas, um renomado estudioso de assuntos coloniais do Brasil, trata desta dimensão da religiosidade dos índios deste período. Com muito brilhantismo e competência, o autor reúne fontes fidedignas que nos revela à preocupação, por parte dos portugueses - jesuítas, após terem se apercebidos da estrutura ritual religiosa contida nos Tupinanbás -- tupi, tribo que iremos nos concentrar neste humilde trabalho.

A principal tarefa dos portugueses - inacianos no Brasil seria a de "organizar" os índios, trazê-los para a verdadeira fé cristã, para que assim, costumes como a poligamia, a antropofagia, o andar sem roupas, dentre outros, fosses extirpados. Havia unanimidade quanto ao entendimento, por parte dos jesuítas, que tal feito seria fácil, visto que, segundo Nóbrega, estes nativos não adoram nenhum Deus, dizia ele: "são como papel branco, onde podemos escrever à vontade", eram os tupinambás.


Entretanto, não demorou muito para os padres se conscientizarem quanto às dificuldades que os aguardara, eles achavam que os índios eram governados sim, mas pelo demônio, seria, portanto, um trabalho árduo e, sobretudo, perigoso.

O fato é que os jesuítas não tinham muito tempo para o feito "missionário", pois a colonização precisava de mão -- de -- obra. Em Pernambuco no ano de 1530 a colonização do açúcar já estava funcionando. Temos de um lado a resistência dos índios e do outro as ambições escravistas, na ocasião, para engenhos de açúcar. A verdade é que os índios ficaram entre os apresadores de escravos (mamelucos) e os padres jesuítas. Estes últimos diziam para os pajés que eles, padres, eram os verdadeiros pajés, diziam ainda que os índios não poderiam seguir os mamelucos, por outro lado, estes apresadores também instaram os nativos para que não ouvissem os jesuítas.

Os índios ora ouviam os apresadores, ora os padres, mas em outras oportunidades não ouviam nem um nem outro, travando assim, uma guerra que terminava com rituais antropofágicos.

Os colonizadores, segundo Vainfas, ficaram impressionados com a descoberta de um dos rituais dos tupis, denominado santidade. Para os índios esta santidade era a constante procura da Terra sem Mal, um espaço sagrado, o tempo sagrado, que se renova eternamente, sem conhecimento de sua origem e fim.

Essas descrições estavam presentes pela santidade Jaguaripe (movimento que desenvolveu-se no recôncavo baiano, conforme veremos), um tipo de idolatria indígena, minuciosamente estudada pelo autor. Era um movimento religioso do século XVI. Vainfas diz que esta santidade era um mito, que se posicionava contra a história, falaremos um pouco mais deste movimento daqui a pouco.

O que podemos ver é, na verdade, uma grande resistência, por parte dos nativos. Uma resistência antiescravista que era absorvida por esta santidade tupi.

Nóbrega conhecera o rito da santidade, logo percebeu o perigo desta dimensão dos nativos, descreveu em 1549 uma cerimônia denominada caraimonhaga, onde o pajé pregava a cultura tupi, revelando para seus seguidores o vindouro "paraíso tupi", a Terra sem Mal. Nóbrega chamou este momento de santidade, tal fenômeno, para ele, era diabólico.

Reconhecendo as sérias dificuldades em "converter" os tupinambás ao cristianismo católico, os jesuítas decidiram substituir a língua sagrada (latim) para estabelecer os procedimentos cristãos por meio da língua tupi, ensinando-a com a ajuda de José de Anchieta que transmitiu aos noviços da Companhia.

Era a denominada "língua geral", que abrigou praticamente todos episódios da atividades cristãs daquele século. Os portugueses fizeram peças teatrais com referências bíblicas, onde então demonizavam os chefes e os costumes indígenas, mostrando para os nativos que o verdadeiro Deus esta com eles, nestas peças o "mal" era vencido pelo bem que estava ao lado do homem branco.

"O catolicismo ensinado e dramatizado em "língua geral" e com base em imagens e significados extraídos da cultura nativa podia ter lá sua eficácia, mormente com os culumins -- as crianças que, pela tenra idade, estavam em condições melhores de aprendizado. Tal método trazia, porém, grandes riscos, sobretudo o risco de o catolicismo fosse assimilado à moda Tupi, canibalizado e devorado como no repasto cerimonial.
A santidade contra a Igreja Católica e os Jesuítas.

Os que aderiam à santidade, aqui inclui-se "negros" da terra (escravos), posicionavam-se contra os senhores e contra os brancos, questionando o Deus católico. O índio Silvestre foi um personagem nesta condição, e acabou açoitado e posto em grilhões pelo seu próprio senhor.

"Os índios zombavam dos padres e dos sacramentos por eles ministradas, alardeando que a verdadeira fé era a sua, assim como deus era o seu ídolo, e santos os seus caraíbas. {Quando os brancos iam ouvir missa} -- contou Álvaro Rodrigues -- {eles (os índios) davam apupadas dizendo que os brancos andava muito tempo errados naquela erronia de cristãos} (...), escrava de um ferreiro em Parpe, costumava zombar da hóstia consagrada e do próprio Deus cristão" ...

Os adeptos da santidade ameaçavam os "nativos traidores" (índios) com as piores penas. Na verdade, uma metamorfose punitiva, como chamou Vainfas, ameaçavam transformar os resistentes em animais, pedras, paus, etc.

O mito da Terra sem Mal, conta o autor, revela o maior inimigo do índio: o homem branco, os portugueses, o cativeiro, sua Igreja dos padres, a lei dos cristãos..., temos, portanto, um sentido anticolonialista, O autor diz também que, paradoxalmente, algumas dimensões do catolicismo também fora absolvido pela santidade, dizendo, por exemplo, da semelhança havida entre a Terra sem Mal e o paraíso celestial cristão.

"a igreja dos índios -- diziam -- era a verdadeira santidade para ir ao céu, porque a dos cristãos era falsa e não merecia que nela se acreditasse".

O fato é que praticamente todo o litoral brasileiro passou a conhecer este termo santidade, e também seu significado. A busca da Terra sem Mal significava uma "guerra" contra os portugueses, contra a escravidão, etc. A mais importante santidade ocorreu no recôncavo baiano, liderada por Antônio, nome de batismo, ancestral dos tupinambá. Esse líder de Jaguaripe, foi um dos exemplos práticos dos perigos da tradução feita pelos jesuítas do catolicismo para ingua e o imaginário Tupi. Antônio entoava cerimônias de batismo, nomeava papas, bailes tribais, orações, sua companheira era chamada de Maria Mãe de Deus, estava, portanto, feita a fusão católica e indígena.

Em suma, a história demonstra as aproximações da Terra sem Mal dos tupis com as alusões jesuísticas, os portugueses católicos que conseguiram enganar os "homens gentios" dizendo sobre a Terra prometida (Jerusalém), quando na verdade, esta terra fora travestida nas fazendas de escravos.

A perseguição do Santo Oficio de Lisboa contra Jaguaripe (idolatrias indígenas) e o Acotundá (idolatrias negras)

O Santo Oficio tinha muito a fazer, conforme afirma Ronaldo Vainfas: "teria de enfrentar não apenas interpretações heterodoxas do divino, mas múltiplos santos pelo avesso". De acordo com o autor, a rigorosidade do Santo Oficio, em suas visitações realizadas na "Bahia de todos os santos", apresentou-se menos intensificada com relação aos negros, de acordo com relatos do Acotundá, tal comportamento, segundo Ronaldo, deve-se principalmente com relação a escravidão que não podia, de forma alguma, sofrer um enfraquecimento.

A perseguição frente aos cristãos novos

Diferentemente aconteceu com os judeus (cristãos novos) convertidos a força por D. Manuel I em 1497 em Lisboa. Muitos destes fugiram para o Brasil, com receio da inquisição instalada em Portugal entre 1536 e 1540.

Esta estratégia dos cristãos novos deu certo por um bom tempo, pois não havia presença da inquisição na colônia. Evaldo Cabral de Mello evidencia que estes judeus foram importantes para o desenvolvimento, sobretudo em Pernambuco, da açucarocracia, termo adotado por este magnífico historiador.

O quadro mudou-se com a visitação em 1591 na Bahia e Pernambuco, enviado pelo Santo Oficio de Lisboa, o visitador Heitor Furtado de Mendonça, para verificar denúncias de heresia contra o catolicismo.

Judaizar em segredo, esta foi uma das inúmeras acusações proferidas por Heitor. Muitos foram julgados e condenados à fogueira. Ana Rodrigues, moradora da Bahia foi sentenciada, ficou trancada em Lisboa até sua morte chegar, segundo relatos, aos 100 anos de idade. Após seu enterro foi decretara sua condenação a fogueira, então desenterram-na e queimaram seus ossos.

A perseguição atravessava o século XVII, os judeus eram criminosos à vista da época. Vainfas revela que a força do judaísmo, com o passar do tempo, foi cada vez mais enfraquecendo, demonstrando-se como cultos superficiais e secretos, como cerimônias domésticas. Segundo o autor, "até mesmo o judaísmo acabou se cristianizando, à moda católica, nessa época, transitando de uma cultura ode letras para uma economia de gestos".

Vainfas diz ainda que os cristãos novos, devido a obrigatoriedade exercida pelos "verdadeiros cristãos de Lisboa", de se seguir o catolicismo, adorando imagens, criou uma revolta muito grande, revolta que muitas vezes era manifestada com maus tratos a imagens de santos, por exemplo, a banalização do crucifixo. Para os "verdadeiros cristãos" os judeus eram os piores hereges, para alguns estudiosos do assunto, afirma o autor, os atos dos cristãos novos nada mais era do que vingança.

Contudo, a vida cotidiana dos colonos no novo mundo não fora nada tranqüila, muito pelo contrário, seja os cristãos novos, seja os inacianos, todos viveram momentos de angústia e indefinições, momentos de constante contato com as dificuldades ora elaboradas por seus costumes, ora por seus inimigos de religião. A verdade é que tanto o céu com o inferno eram atingidos com extrema facilidade, diante de tantas dificuldades no dia -- a dia, os pedidos para santos e derivados eram inúmeros, bastava que um destes pedidos não fossem atendidos para o espírito de rebeldia se manifestar contra os ícones da fé católica cristã.

Fonte: www.historianet.com.br

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